Caros Pacientes: Para vocês é muito difícil, mais difícil do que a maioria das pessoas conseguem entender. Estar sentado à 16 anos a ouvir as histórias, a ver o cansaço nos vossos olhos, a ouvi-los descrever o indescritível, levou-me a entender que eu também não consigo compreender como são as vossas vidas. Como se responde à pergunta “como se sente?” quando já se esqueceu como é sentir-se “normal”? Como se lida com todas as pessoas que pensam que você está a exagerar na sua dor, nas suas emoções, no seu cansaço? Como você decide quando acreditar neles ou quando confiar no seu próprio corpo? Como é que você lida com uma vida que não o deixa esquecer a sua fragilidade, os seus limites, a sua mortalidade?
Eu não consigo imaginar. Mas eu realmente posso acrescentar algo que você não sabe. Eu realmente possuo informações que você não consegue entender devido à sua própria perspetiva, ao seu mundo singular. Existe algo que você precisa de entender, se bem que não vai apagar a sua dor, fazer a sua fadiga desaparecer, ou melhorar as suas emoções, irá ajuda-lo. É informação que sem a qual você sofrerá mais do que o necessário, é uma verdade que é a chave para ter a ajuda que você precisa de forma mais acessível do que no passado. Pode não parecer importante, mas confie em mim, é. Você assusta os médicos. Não, não estou a falar sobre o medo da doença, dor ou morte. Estou a falar sobre os médicos terem medo dos limites dos seus conhecimentos. Estou a falar sobre o seu entendimento sobre um facto que toda a gente parece esquecer, um facto de que muitos médicos se escondem: nós somos normais, pessoas falíveis que por um mero acaso são médicos. Nós não somos especiais. Na verdade, muitos de nós são inseguros, sempre à espera do reconhecimento e do agradecimento daqueles que ajudamos. Queremos curar doenças, salvar vidas, ser a mão que ajuda, a pessoa certa no sítio certo na hora certa. Mas uma doença crónica incurável é um obstáculo no nosso caminho. Você não melhora e muitos de nós ficam frustrados, e alguns de nós zangados consigo. Não queremos enfrentar coisas que não podemos resolver porque revela os nossos limites. Nós queremos algo milagroso e você nega-nos essa hipótese. E como é esta a perspetiva que você tem quando consulta os médicos, a sua opinião deles é bem diferente. Você vê-nos a ficar frustrados. Você vê quando parece-mos querer desistir. Quando cuidamos de si, temos que deixar para trás a ilusão de controlo, de poder sobre a doença. Nós ficamos zangados, sentimo-nos inseguros, e queremos passar para um paciente que podemos ajudar, salvar ou impressionar. Você é a rocha que prova quão fácil é afundar um navio. Portanto a sua visão dos médicos é bem diferente. Depois há o facto que você também possui algo que normalmente é do nosso domínio: conhecimento. Você sabe mais sobre a sua doença do que muitos de nós – a maioria de nós. A sua esclerose múltipla, artrite reumatoide […] – a sua definição de dor – é algo que a maioria de nós não encontra regularmente. É algo que a maioria de nós tenta evitar. Por isso você possui uma compreensão profunda de algo que muitos médicos não possuem. Mesmo os médicos especializados na sua doença não partilham o tipo de conhecimento que só é possível adquirir ao viver com a doença. É como o conhecimento dos pais sobre seus filhos versus o de um pediatra. Eles podem respirar conhecimento mas você tem um conhecimento real que nenhum médico pode ter. Então quando você vai a um médico – especialmente um que nunca conheceu – você vai com um conhecimento da sua doença que eles não têm, e um conhecimento das limitações do médico que poucos outros pacientes sabem. Vê porque você assusta os médicos? Não é culpa sua que isso aconteça, mas ignorar este facto vai limitar a ajuda que poderá ter deles. Eu sei disso porque, tal como você conhece a sua doença melhor do que qualquer médico, eu sei o que um médico sente mais do que qualquer paciente poderá alguma vez entender. Você encontra médicos intermitentemente (talvez mais do que deseja); eu vivo como médico continuamente. Então deixe-me ser bem corajoso e dar-lhe um conselho para lidar com médicos. Existe algumas coisas que pode fazer para tornar as coisas mais fáceis, e outras que podem sabotar qualquer esperança de um bom relacionamento: Não “entre a matar”- sim você precisa de se defender, mas lembre-se que os médicos estão habituados a estarem em controlo. Todos os outros pacientes entram no consultório com imediato respeito, mas o seu conhecimento acabou com a ilusão do “médico todo-poderoso”. É algo bom a longo prazo, mas poucos médicos querem ser confrontados com essa realidade logo no início. O seu objetivo com qualquer médico é criar uma parceria de confiança em ambos os lados, e “entrar a matar” logo no início pode impossibilitar as suas hipóteses de alguma vez vir a ter isso. Mostre respeito – eu digo isto cuidadosamente, porque certamente existem médicos que não tratam os pacientes com respeito – especialmente aqueles que tal como você têm uma doença crónica. Estes médicos devem ser evitados. Mas a maioria de nós não é assim; nós realmente queremos ajudar as pessoas e tentamos trata-las bem. Mas nós trabalhamos arduamente para ganhar a nossa posição; não nos foi deixada de herança. Tal como você quer ser ouvido, nós também. “Poucos mas bons” – Procure um bom médico de clinica geral e alguns especialistas em quem você confie. Não espere que um novo médico descubra as coisas rapidamente. Foram necessários anos de consultas repetidas para realmente entender muito dos meus doentes com doenças crónicas. O melhor tratamento acontece quando o médico compreende o paciente e o paciente compreende o médico. Isto só acontece com o passar do tempo. […]. É algo muito poderoso ter um entendimento construído ao longo do tempo. Vá às urgências só quando absolutamente necessário – os médicos do serviço de urgências vão ter sempre problemas consigo. Espere isso. O trabalho deles é decidir se você precisa de ser hospitalizado, se precisa de tratamento urgente ou se pode ir para casa. Eles podem não tratar a sua dor e certamente não vão tentar compreende-lo totalmente. Não é o trabalho deles. Eles fizeram a sua especialidade para tratar dos problemas rapidamente e seguir em frente, e não lidar com doenças crónicas. O mesmo aplica-se a qualquer médico que consulte por pouco tempo: eles tentarão atende-lo o mais rápido possível. Não evite os médicos – Para mim uma das coisas mais frustrantes é quando pacientes complicados aparecem após um longo período de ausência com uma enorme lista de problemas que querem que eu resolva. Eu não consigo trabalhar assim e não acho que muitos médicos consigam. Cada consulta deve abordar só alguns problemas de cada vez, caso contrário as coisas ficam confusas e mais erros são cometidos. Está certo manter uma lista dos seus próprios problemas para nada ficar de fora – e até gosto de ter essas listas, desde que as pessoas não esperem que eu resolva todos os problemas. Ajuda-me a priorizar os seus problemas. Não ature idiotas – a não ser que não tenha outra hipótese (nas urgências, por exemplo) você deve continuar a procurar até encontrar o(s) médico(s) certo(s) para si. Alguns médicos não foram feitos para doenças crónicas, enquanto alguns de nós gosta de relacionamentos a longo prazo. Não sinta que tem de lidar com médicos que não ouvem ou minimizam os seus problemas. No mínimo, você deve ser capaz de um encontrar um médico que não seja completo incompetente. Perdoe-nos – às vezes esqueço-me de coisas importantes na vida dos meus pacientes. Às vezes eu não sei que você teve uma operação ou que a sua irmã também me vem consultar. Às vezes evito as pessoas porque não quero admitir as minhas limitações. Seja paciente comigo – eu normalmente sei quando fiz asneira, e se me conhece bem eu não me importo de ser chamado à atenção. Bem, talvez me importe um bocadinho. Você sabe melhor do que ninguém que nós médicos só somos pessoas – com toda a estupidez, inconsistência e falibilidade que daí advém – que por acaso são médicos de profissão. Espero que isto ajude, e que realmente consiga o auxílio que necessita. É muito chato que você tenha o seu problema; eu só espero que isto talvez diminua essa chatice um bocadinho. Sinceramente, Dr. Rob Artigo publicado na revista Fibromyalgia & Chronic Pain Life Summer 2013, pág. 17-18. http://www.fmcpaware.org/ Traduzido por: Fátima Figueiredo
4 Comments
Henriqueta Abreu
25/2/2016 02:35:33 am
Reply
Muito bom esse depoimento. Obrigada Doutor pela sensibilidade. Obrigada de coração.
21/5/2016 12:54:55 am
Reply
Fernanda Costa
22/5/2016 09:08:13 am
Obrigada Doutor, por dar a conhecer ao Mundo e a outros Médicos, que esta doença realmente existe. Sou uma Mãe que acompanha uma filha com esta doença e que nunca deixou de trabalhar, mesmo com as suas limitações.
Reply
Noemia Moura da Silva
6/6/2016 04:50:35 pm
Me sinto mais leve por saber que existem pessoas médicos, que acreditam no que um paciente com essa doença é problemático, pela própria enfermidade, é difícil mais não é impossível. Quando se acredita que existe um Deus. Obrigado Dr.foi bom ter lido tudo isso, espero mais informações quando tiver. Deus te abençoe hoje e sempre.
Reply
Leave a Reply. |
Subscreva a nossa newsletter trimestral para receber no seu e-mail todas as novidades.
Categorias
All
Informação:- Os artigos que colocamos no site são traduções feitas por nós de sites estrangeiros. Arquivos
May 2023
|